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Imprensa próxima ao governo espanhol reconhece que este utiliza o tema ETA para chantagear Cuba no diálogo com os EUA

prensa gobierno españolDurante anos, uma mensagem “antiterrorista” mais dura contra a organização basca ETA foi fator de captação de votos para o direitista Partido Popular espanhol, hoje no governo (1). Em claro declínio nas pesquisas para as próximas eleições (2), o partido tenta agora ressuscitar o fantasma do ETA, apesar de a organização ter cessado a atividade armada há mais de três anos (3).

Neste cenário, se situa uma nova campanha, encabeçada por jornais próximos ao governo espanhol, como “El Mundo” (4) e “ABC” (5), sobre a presença de membros do ETA em Cuba.

Tudo começou com a recente visita a Havana de José Luis Rodríguez Zapatero, ex-presidente do governo espanhol. Sua visita, de âmbito privado, estava inserida em uma iniciativa internacional que pede aos governos a abolição definitiva da pena de morte. Cuba ainda mantém a sanção em seu código penal, embora não a aplique há 12 anos (6).

O presidente cubano Raúl Castro atendeu pessoalmente Zapatero, que, por sua vez, respaldou a reivindicação de Cuba em ser retirada da “lista de países que apoiam o terrorismo”, elaborada pela Casa Branca e que implica em sanções adicionais ao bloqueio que já atinge a ilha (7).

Que Raúl Castro atendesse Zapatero e não recebesse, em novembro, ao atual ministro espanhol de Assuntos Externos, José Manuel García-Margallo, irritou profundamente o governo espanhol e sua imprensa mais próxima (8).

Somente o diário “El Mundo” publicou, em pouco mais de uma semana, 16 notas e artigos justificando o incômodo do governo espanhol (9).

O ministro García-Margallo criticou Zapatero com um argumento que revela como a Espanha tenta colocar obstáculos ao incipiente diálogo Cuba-EUA: Madri estaria solicitando à Casa Branca a manutenção de Cuba na citada “lista de países terroristas” enquanto Havana não extraditar dois dos membros do ETA residentes na ilha (10).

Dessa forma, governo e imprensa espanhola aproveitaram para ressuscitar o mito da suposta colaboração do governo cubano com o ETA.

Recordemos que membros do grupo foram acolhidos em Cuba – como também no Panamá, Uruguai, Nicarágua, Cabo Verde, São Tomé e Príncipe, Venezuela e República Dominicana – há mais de 30 anos, por solicitação expressa do governo espanhol de Felipe González (11). O atual pedido de extradição de dois deles seria baseado na suposta aparição de seus nomes no computador de Raúl Reyes (12), chefe guerrilheiro colombiano assassinado em 2008, cujos discos rígidos foram, de acordo com numerosas organizações de direitos humanos, manipulados pelos serviços colombianos de inteligência (13).

O pedido de extradição parece, além disso, fora do tempo: os guerrilheiros da Farc negociam com o governo colombiano a paz definitiva há dois anos, exatamente em Havana (14). E o ETA, há mais de três anos, está em cessar-fogo também definitivo (15).

Em 28 de fevereiro, a jornalista do diário “El Mundo”, Ángeles Escrivá, em texto intitulado “Espanha pede a Cuba a extradição de dois históricos membros do ETA”, atuava como porta-voz de fato do governo espanhol (16). “Havana deu o silêncio como resposta (ao pedido de extradição)”, dizia, “apesar de (…) que é chave para que a Espanha mostre-se favorável à reivindicação” de Cuba para ser retirada da lista norte-americana de países colaboradores com o terrorismo.

Essa chantagem prepotente e neocolonial pregou uma peça na jornalista, que cometeu dois deslizes antológicos na notícia.

Um: afirmar que a “questão (das extradições) é chave para que a Espanha retire o regime castrista da lista de países que colaboram com o terrorismo”. Ou seja, ela confundiu a autoria da famosa lista, atribuindo-a à Espanha e não aos EUA, país que realmente a elabora. Dois: ao referir-se a outros dois militantes do ETA que, supostamente, também vivem em Cuba, depois de reconhecer que “nenhum deles tem pendências” com a justiça espanhola, a jornalista acrescentava que “sua entrega (à Espanha) demonstraria boa vontade” (por parte de Cuba). A pergunta é óbvia: se eles não possuem pendências, a que juiz Cuba deveria entregá-los?

Em resumo: o Partido Popular utiliza, uma vez mais, o nada original tema do “antiterrorismo” para segurar um eleitorado em fuga maciça. E a grande imprensa espanhola cumpre, uma vez mais, seu papel de propagandista. Neste caso, não apenas do governo espanhol, mas das posições políticas norte-americanas à direita da própria Casa Branca (17).

(1) http://www.rebelion.org/noticia.php?id=175567

(2) http://www.huffingtonpost.es/2015/03/08/encuesta-metroscopia_n_6825502.html

(3) http://gara.naiz.eus/eta-anuncia-cese-definitivo-actividad-armada.php

(4) http://www.elmundo.es/espana/2015/02/28/54f19c98268e3e333d8b4573.html

(5) http://www.abc.es/espana/20150302/abci-margallo-zapatero-201503021054.html

(6) http://www.noticias24.com/internacionales/noticia/98762/raul-castro-recibio-en-cuba-al-expresidente-espanol-jose-luis-rodriguez-zapatero/

(7) http://noticias.terra.es/mundo/latinoamerica/zapatero-cierra-gira-a-cuba-que-causa-ira-del-gobierno-espanol,cd0ae7f51a7cb410VgnCLD200000b1bf46d0RCRD.html

(8) http://www.libertaddigital.com/espana/2015-02-26/margallo-muy-molesto-tilda-de-desleal-e-inoportuno-el-viaje-de-zapatero-y-moratinos-a-cuba-1276541747/

(9) http://www.elmundo.es/internacional/2015/02/27/54f0377be2704e240b8b4574.html

(10) http://www.elmundo.es/espana/2015/03/02/54f43ae7e2704e9b578b4576.html

(11) http://www.elconfidencial.com/espana/eta-venezuela-audiencia-nacional-20100324.html

(12) http://www.rebelion.org/noticia.php?id=191453

(13) http://www.rebelion.org/noticia.php?id=67521

(14) http://ecodiario.eleconomista.es/internacional/noticias/6507152/02/15/Negociaciones-de-paz-con-las-FARC-han-evitado-unas-5000-victimas-segun-un-informe.html#.Kku8X4RtayrP98C

(15) http://www.cubadebate.cu/noticias/2014/09/27/eta-hace-llamado-para-aprovechar-contexto-favorable-para-independencia-vasca-video/#.VP9gb47SmCU

(16) http://www.elmundo.es/espana/2015/02/28/54f119f5e2704e5d128b4579.html

(17) http://www.lavozdegalicia.es/noticia/internacional/2015/02/26/senador-republicano-dice-kerry-cuba-refugio-eta-farc/00031424974297652793132.htm

( José Manzaneda, de Cubainformación)

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