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O triunfo do capitalismo: empregos zero

John Kozy

Traducido por  Coletivo de tradutores Vila Vudu

(Tlaxcala)

Navio para a Califórnia no início da Corrida do Ouro

Toda essa teoria baseia-se numa mera fé pop-psicológica segundo a qual, se se dá dinheiro a alguém, o alguém investirá produtivamente aquele dinheiro. Mas não há como obrigar os ricos a fazerem isso, eles não fazem, pior, nunca fizeram, de fato, porque criar empregos não é missão da empresa. Missão da empresa é fazer dinheiro, e obter incentivos do estado é, só, mais um jeito de fazer dinheiro. Dar dinheiro às empresas nunca porá fim a recessões e depressões. De fato, o mais provável é que as prolongue, porque nenhuma empresa jamais criará empregos se não estiver convencida de que criar empregos aumentará os lucros.

Durante a Corrida do Ouro na Califórnia, os comerciantes só iam para os campos de garimpo depois de o ouro já ter sido descoberto, e saíam dos garimpos no instante em que o veio secava. Nunca usaram o capital que lá acumularam arrancado dos mineiros para abrir negócios produtivos que gerassem empregos para os garimpeiros que, no final, estavam desempregados. Nas economias capitalistas, o capital não existe para ser gasto em empreendimentos: ele existe para ser acumulado. A empresa não existe para criar empregos. A empresa só cria empregos se os novos empregos servirem aos seus objetivos de obter mais dinheiro.

A chamada ‘sabedoria convencional’ é sempre perigosa. Na maioria das vezes, a sabedoria convencional está errada. Mas a sabedoria convencional pode ser classificada em dois grandes blocos: a sabedoria a favor e a sabedoria contra. Todas as manifestações de sabedoria convencional tem seus ‘do contra’, e, assim como toda a sabedoria convencional pode não passar de meras crenças, sem qualquer fundamento, as posições ‘do contra’ aquela sabedoria sem fundamento tampouco têm qualquer fundamento.

Por exemplo, todos veem que a economia está desabando, mas muitos críticos parecem crer que os problemas que a economia enfrenta hoje sejam problemas novos. Nada disso. Esses são problemas muito antigos. A economia hoje pouco difere da economia dos anos 1600s, quando a economia chegou aos EUA, trazida da Inglaterra. Os horrores da economia da Inglaterra no século 17 são exatamente os mesmos da economia de hoje. A riqueza concentrada em poucas mãos, a miséria distribuída igualmente para muitos. Alta criminalidade em toda a sociedade. Desemprego generalizado, subempregos, empregos degradantes. A dignidade humana destruída. Famílias sem teto, fome e muitas guerras nas quais morrem muitos pobres em benefício dos comerciantes. Discriminação por todos os lados, de vários tipos. Governos que governam para os ricos, não para os pobres nem, sequer, para todos, que fosse. E, embora tenha havido curtos períodos em que o povo foi levado a acreditar que a vida estaria melhorando, esses períodos sempre acabaram em colapsos econômicos que consumiram todos os ganhos que as pessoas comuns tivessem tido.

As características universais dessa economia aparecem exemplificadas na seguinte historinha, plenamente histórica:

Dia 24/1/1848, James W. Marshall descobriu ouro em Sutter’s Mill, Coloma, Califórnia.

Quando a novidade espalhou-se, centenas de milhares de pessoas correram para a Califórnia. No local onde o ouro fora descoberto, mineiros trabalharam juntos e ergueram um acampamento e declararam-se proprietários. Nasceram assim as vilas de Rough and Ready, Hangtown e Portuguese Flat, além de várias outras, e os comerciantes acorreram para lá em enxames, montaram negócios, logo construíram prédios, acampamentos, tendas e ali se passou a vender de tudo, bens e serviços. Os mineiros viviam em tendas, barracos, cabines arrancadas de barcos abandonados. Cada grupamento tinha seu próprio saloon e respectivo cassino. Mulheres de várias etnias desempenhavam diferentes funções, de prostitutas a empresárias single.

No início, o ouro jorrou fácil, “livre, para quem pegasse”. As disputas resolviam-se pessoal e violentamente. Quando a extração do ouro começou a ficar cada vez mais difícil, os americanos começaram a atrair estrangeiros para lá. O Senado Estadual aprovou então um imposto para mineiros estrangeiros, de 20 dólares por mês, e os norte-americanos que faziam prospecção de novos veios organizavam ataques contra os estrangeiros, sobretudo contra latino-americanos e chineses. Além disso, o grande número de recém-chegados expulsavam norte-americanos nativos de suas áreas tradicionais de caça, pesca e reunião. Vários revidaram e atacaram mineiros. O que provocou retaliações. Os nativos foram muitas vezes massacrados. Os sobreviventes, incapazes de sobreviver, morriam de fome. Nativos morriam de catapora, gripe e rubéola, aos magotes. O estado da Califórnia aprovou a Lei de Governo e Proteção aos Índios, que permitia que os colonos capturassem e usassem nativos como escravos. Permitia também o tráfico de força de trabalho de norte-americanos nativos, sobretudo de mulheres jovens e crianças – tráfico tratado como empresa comercial legal. Generalizou-se a caça a nativos, as vilas de nativos eram regularmente atacadas e saqueadas, mulheres e crianças capturadas para serem vendidas. Não era melhor a situação dos imigrados: morreu um em cada doze (as taxas de mortalidade e crime durante a Corrida do Ouro foram extraordinariamente altas e, correspondentemente, cresceu muito a obsessão com a segurança, que também matou muitos).

As técnicas hidráulicas de extração de ouro tornaram-se prevalentes. Subproduto delas, cresceram muito os depósitos de poluentes, metais pesados e outros, que foram, todos, parar nos rios e riachos. No século 21 ainda há áreas contaminadas pelos resíduos da mineração hidráulica do ouro, além de terras tornadas imprestáveis.

Os comerciantes ganharam muito mais dinheiro que os mineiros. O homem mais rico da Califórnia nos primeiros anos da Corrida do Ouro foi Samuel Brannan, incansável autopromotor, dono de lojas e de jornais. Cerca de metade dos que prospectavam ouro tiveram lucro modesto. Mas a maioria ou ganhou pouco ou perdeu dinheiro. Em 1855, o clima econômico mudara dramaticamente. Só se encontrava ouro a explorar com lucro mediante grandes empresas organizadas, com muitos trabalhadores que eram, ou sócios, ou empregados. Em meados dos anos 1850s, só os donos dessas grandes empresas de mineração ganhavam dinheiro. E quando os veios secaram, de vez, os comerciantes saíram de lá muito mais depressa que os mineiros. Foi o fim da corrida do ouro.

Já escrevi várias vezes sobre esses traços horrendos das economias capitalistas, especialmente sobre a sua abjeta imoralidade. Hoje, prefiro discutir uma falsidade óbvia que ainda se escuta, incansavelmente repetida, sobretudo por políticos da direita e seus parceiros, os economistas por profissão: todos esses vivem de dizer que as empresas, não os governos, criam empregos.

É ideia evidentemente falsa, e a generalização a torna perigosamente ambígua. O quê, precisamente, significa essa ideia, sobretudo se se sabe que os políticos que vivem a repeti-la consomem toneladas de dinheiro para gerar os empregos que as empresas absolutamente não geram?! Nenhuma empresa jamais criou os empregos de deputado, senador ou presidente. Que sentido faz que deputados, senadores e presidentes vivam a repetir que são as empresas, não os governos, que criam empregos? Não há mais completa estupidez, que essa.

A verdade é que a empresa não tem qualquer interesse e criar empregos. Basta considerar a historieta acima. Os comerciantes afluíram como enxame para os campos de mineração de ouro depois de o ouro ter sido descoberto e, como enxame, voaram para longe de lá, quando os veios secaram. Não usaram o capital lá acumulado para criar empregos para os mineiros e buscadores de ouro, quando desempregados.

Nas economias capitalistas, o capital não existe para ser consumido: existe para ser acumulado. Empregados são simples meios para essa finalidade, e, se um empresário puder acumular capital sem usar empregados, ele o fará. É, em grande medida, o que acontece hoje nos EUA. Os empresários descobriram modos de acumular capital sem precisar dos trabalhadores norte-americanos e o governo muito ajudou os empresários a fazer exatamente isso.

Portanto, quando um político advoga que se deem incentivos fiscais a empresários, para induzi-los a criar empregos, esses políticos empenham-se num absurdo sem limites. Esse tipo de proposta só faz prover os empresários com uma ferramenta a mais para extrair dinheiro das pessoas comuns, sem sequer precisar negociar com elas, e o capital que os empresários obtêm desse modo apenas se soma aos depósitos no banco de acumulação de capital. Por que um empresário pensará em criar empregos e, simultaneamente, inventar riscos para o próprio capital? Supor que algum empresário algum dia usará aquele capital para criar empregos é a falácia da economia de oferta, a qual, aliás, baseia-se em nada além de alguma vaga pop-psicologia.

A economia de oferta baseia-se na crença de que se o governo reduzir impostos dos ricos, eles investirão suas economias em novas fábricas, nas quais se instalarão modernas tecnologias que produzirão bens a baixos custos, que empregados contratados farão subir as taxas de empregos, e que mais empregados farão aumentar a arrecadação. A economia puxar-se-á para cima, ela própria, puxando-se pelos cadarços dos próprios sapatos. Não acontece, não acontecerá e, com certeza, nunca aconteceu.

Toda essa teoria baseia-se numa mera fé pop-psicológica segundo a qual, se se dá dinheiro a alguém, o alguém investirá produtivamente aquele dinheiro. Mas não há como obrigar os ricos a fazerem isso, eles não fazem, pior, nunca fizeram, de fato, porque criar empregos não é missão da empresa. Missão da empresa é fazer dinheiro, e obter incentivos do estado é, só, mais um jeito de fazer dinheiro. Dar dinheiro às empresas nunca porá fim a recessões e depressões. De fato, o mais provável é que as prolongue, porque nenhuma empresa jamais criará empregos se não estiver convencida de que criar empregos aumentará os lucros.

2 Comentários

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  1. Diego / Ilusão

    Na verdade esses malditos democratas ou simpatizantes da causa são os primeiros a ficar putos da vida quando perdem seus “maravilhosos empregos” e descobrem que depois de tanto esforço tinham o mesmo valor que o lixo para seus patrões. Depois tornam a repetir o mesmo erro num processo cíclico. E, ainda assim, continuam olhando só para seu umbigo.
    Quanto aos “empregadores” qualquer faculdade de administração sugere a leitura de Eliyahu Goldratt, a Meta. Se você ler o livro não se espantará. Mas a Meta não é gerar emprego (novidade), é lucrar. Com pouca mão-de-obra (e barata). E se não tiver EMPREGADOS mas tiver como executar o serviço isso é maravilhoso. Viva! Adoro essa democracia que vivemos.

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  2. Yuki / www.facebook.com/profile.php?id=100003405425908

    Tedes moita razón, se saben que con iso poden gañar diñeiro, lotmcaienxe van traballar ata esgotalo, non creas que porque se enteren dos danos o van a deixar.

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